Sobre Arquivo 17, Catálogo da Exposição

Sobre Arquivo 17, Catálogo da Exposição

Achei muito interessante implodir a história, de fato isso é necessário. E são inúmeras as resistências, inclusive dos que criticam os vários micropoderes que estão aí mantendo e sustentando esse modo tão selvagem de exploração e opressão que existe, principalmente para com as mulheres, para com os negros e com todos que vivenciam formas não hegemônicas de vivenciar o amor.

Adorei a simbologia da barricada, tão bonita e forte. A vivência baseada na competição e reforçada pela alienação da pessoa leva a um distanciamento sempre maior das formas de resistência representadas nessa simbologia.

Caminhamos para onde? Penso sempre no 1984 de George Orwell, A revolução no futuro de Kurt Vonnegut, Blade Runner, o caçador de androides (1982) de Ridley Scott, magistralmente sintetizado por Noam Chomsky em “Os novos senhores da humanidade”, artigo de jornal publicado em 1992: “os novos senhores da humanidade vivem em ilhas de total prazer num mar de imenso desespero”.

Não tive uma herança cultural familiar que privilegiasse a arte, nem aprendi a desenvolver esse gosto, apesar de ter alguns amigos e companheiros que conhecem muito e desenvolvem interessantes trabalhos nessa área.

Mas gostei muito da forma como os ambientes foram planejados e como as pessoas podem interagir com eles.

Ter o Arquivo 17 como pano de fundo o anarquismo e principalmente as mulheres instigou ainda mais uma busca por compreender um universo que, como homem, apesar de as mulheres estarem sempre tão presentes na minha vida, conheço sempre a certa distância.  

Logo, a Exposição contribuiu para me levar a rever minha forma de ação política, como indivíduo dentro de coletivos. Já não basta mais pensar na emancipação humana, mas entender que essa começa pelo reconhecimento das diferenças: parte dessa humanidade foi mais intensamente explorada, garantindo assim privilégios à outra parte dessa humanidade, que historicamente tem exercido o poder.

A impressão de um exemplar de A Plebe em plena Greve Geral de 1917 na cidade de São Paulo traz outras reflexões sobre essa organização para se chegar às barricadas. Alguns anarquistas defendiam que a greve geral poderia ser o estopim para a revolução social: afinal de contas, se todos os trabalhadores e explorados cruzassem os braços, os que historicamente têm explorado dominariam a quem, e como? Há mais de um século sabemos dos limites dessa estratégia. Como anarquistas e, portanto, seres utópicos, acreditamos no ideal de transformação social, por meio da qual todos tenham liberdade nas suas decisões nas formas de viver, produzir e consumir. E que tem como base a garantia da socialização da riqueza e do poder social para todos os que hoje são explorados e oprimidos. Em muitos momentos ainda desejamos e trabalhamos para reviver estratégias, como a greve geral revolucionária.

Criar ou romancear, no sentido da criação de um personagem, parte do cotidiano das mulheres – tão relegadas ao esquecimento da história, prática chamada de “traição da história” por Jaime Cubero –, por meio da representação da figura “sou aquela mulher no canto esquerdo do quadro”, é um recurso brilhante para o resgate de parte dessa história. Garante visibilidade e voz para quem, como as mulheres, apesar de toda a sua luta, no espaço público e privado, pouco teve garantido como direito.

Gostei e aprendi muito.

Obrigado,

Carlos (Antonio Carlos Oliveira).

 

Antonio Carlos escreveu o texto após conferir o catálogo abaixo.